quarta-feira, fevereiro 08, 2012

Preconceito

O ser humano é curioso e temerário diante do diferente. Desde crianças, sempre que estamos diante de algo que não compreendemos ou que não corresponde aos padrões apreendidos inicia-se uma batalha dentro de nós entre o instinto de descobrir e o de se afastar.

Grande parte da nossa personalidade e dos caminhos que seguiremos depende das proporções com que combinamos estes fatores de medo e curiosidade.

Com o tempo, a curiosidade tende a se transformar em empatia e o medo tende a se transformar em raiva. Nasce assim o preconceito.

Fui criado em uma época em que piadas sobre gays e negros eram comuns até mesmo em programas infantis como os Trapalhões. Entendo que também no humor existe a capacidade de diminuir, de subjugar, de excluir alguém pela piada, mas sempre consegui enxergar o lado do riso que mostra com leveza a diferença e aproxima mais do que afasta.

São linhas tênues.

Sempre tive amigos negros, alguns namoricos com mulheres negras e nunca entendi bem o preconceito. Para mim a diferença da cor da pele é a mesma da cor do cabelo ou da altura. Poderíamos estar dividos entre gordos e magros, com sardas e sem sardas, orelhas presas e orelhas soltas. Até pelo convívio próximo eu nunca tive esse tipo de visão da diferença na questão cor da pele. Às vezes até fazíamos piada, mas nada com o intuito de ofender, apenas repetindo padrões e costumes.

Mas na questão da diversidade sexual a coisa era diferente. A verdade é que na minha adolescência de interior era padrão criticar, evitar, isolar e até mesmo magoar os gays para mostrar como éramos "machos".

Homem que é homem não fala fino, homem que é homem não beija outro homem, coisas do tipo. E isso nos distanciava das pessoas. "Eles" não eram homens, eram algo diferente, estranho.

E por isso eu tive amigos gays que só foram se assumir anos depois e por isso eu agi muitas vezes como um babaca até que eu amadureci e eles também.

Compreendemos mais ou menos ao mesmo tempo que ser gay é como ser louro, ter orelhas de abano ou mãos bonitas. É apenas uma das características que forma aquela pessoa. Passei a compreender, a respeitar e a romper com padrões com os quais fui criado, menos pelos meus pais, e mais pelo ambiente em que vivia.

Para mim, o preconceito perdeu o sentido e já fica difícil entender porque esses caras não podem se casar na igreja ou entrar de mãos dadas no cinema.

"Ah, mas você já chamou um amigo de gay que eu já vi". Sim. E talvez seja apenas um hábito que preciso mudar. Ou talvez não, talvez o humor não precise ser tão correto e tão cuidadoso assim e a brincadeira seja apenas uma brincadeira quando não tem o intuito de machucar. Pode ser também que eu precise refletir ainda mais sobre o assunto.

Não sei.

Mas sei que, para mim, a questão continua a mesma: como reagimos diante do diferente, do que não responde aos padrões aos quais estivemos expostos por tanto tempo. Curiosidade ou medo?

E quanto menos medo, quanto menos ignorância, menos motivos para que continue sendo assim. Porque a violência é quase sempre sinônimo de incompreensão absoluta, a reação de uma criança que, diante de um brinquedo de montar resolve o problema do seu jeito ou se frustra e quebra o joguete.

Eu amadureci (ou estou amadurecendo). E você?



* Parabéns pela inconstitucionalidade da Prop8 na Califórnia.




Direto na têmpora: Elevator love letter - Stars

11 comentários:

Mariana disse...

Ainda bem que posso dizer, com certeza, que amadureci. Quanto as piadas, temos um amigo chamado, carinhosamente, de gordo gay. Desde sempre. Só que ele deixou de ser gordo e passou a ser gay. Mas o apaelido carinhoso continua... gordo gay! Sem nenhum problema!

redatozim disse...

É isso aí, Mariana.

Bruno Rabello disse...

Tenho grandes amigos, alguns dos melhores, que são gays. Uma amiga gay que fez festa de casamento. Outros que comemoram, sempre com ótimas festas, 12, 13 anos que estão juntos. O que me choca é que ainda hoje encontro gente que não se sente confortável em estar junto deles, pessoas divertidas, inteligentes, companheiras. Medo? Pode ser. Gente que se fecha pro diferente (seja o diferente um lugar, uma comida ou um estilo de vida) sempre existiu. E é esse tipo de gente que eu quero conviver cada vez menos!
P.S. Vou passar a comentar mais para ajudar a fazer o tesão por fazer pastéis voltar....

Li disse...

Amadureci. Mas do mesmo jeito que não fico "engolindo" meu namorado no meio da rua/onibus/metro e afins pq acho que ninguém é obrigado a ver isso, tb gostaria de isso acontecesse com outros casais...
Na minha opinião, parece que os jovens buscam a aceitação forçando o limite do respeito com o próximo...

redatozim disse...

Pois é, Bruno, e o mais interessante é quando a pessoa adora a outra até que descobre que ela é gay. A partir daí tudo muda e fica desconfortável, sabe-se lá porque.

redatozim disse...

Li, aí é uma questão diferente. O que te incomoda é o beijo, a carícia explicita demais, independente se entre casais hetero ou homossexuais, estou certo?

Li disse...

Exato...(olha eu fugindo do assunto)...
E seguirei a idéia do Bruno..comentar mais para te animar! =)

redatozim disse...

Valeu!

PC disse...

Pergunta pra Mariana lá de cima se o tal cara sou eu.
Sei lá, fiquei grilado...

redatozim disse...

melhor nem perguntar, PC, vai que é.

Mariana disse...

É não... PC. É não.... rs