terça-feira, junho 16, 2009

A história de Q

Acordar e se olhar no espelho, ver o mesmo rosto, descobrir novas rugas, decepcionar-se com a velha expressão cansada a refletir-se com uma ponta de tristeza.

Sempre uma outra manhã, sempre o mesmo rosto. Este é você.

Q despertava cada dia com um novo rosto, não porque assim desejasse ou buscasse através de algum misterioso truque mental, mas simplesmente porque assim lhe acontecia.

A primeira mirada no espelho era sempre uma surpresa para Q. Nunca sabia se aquele dia iria encontrá-lo negro, gordo, magro, sardento, cego, homem ou mulher. Era a mesma pessoa, mas com um exterior que cambiava a cada 24 horas.

Velhos amigos não o reconheciam, o crachá lhe era inútil e as mulheres o abandonavam instantaneamente a cada novo dia. Q podia aparentar 80 anos em um sábado e ressurgir com 8 na manhã seguinte.

Vitimado pela inconstância do próprio corpo, vivia imensamente a impensável distância do outro, a infinitude do estar sozinho e exercitava diariamente o aprendizado de reconhecer-se.

Era para o mundo um estranho e, para si mesmo, o único conhecido. Todos os homens ao mesmo tempo e ao mesmo tempo, nenhum. Ninguém e todo mundo.




Direto na têmpora: It must be love - Madness

6 comentários:

tita disse...

bacana!

redatozim disse...

valeu, tita

Rebecca Leão disse...

Nossa, de onde você tirou essa idéia?! Caramba, que argumento! Bjs

redatozim disse...

Modéstia às favas eu gostei também, Rebecca. Vou ver se desenvolvo mais isso.

NDMS disse...

Muito bacana mesmo!

redatozim disse...

Valeu, ndms.