Liras de Sintra é ainda um pequeno Portugal, mesmo sem nem de perto sê-lo. Seus vinhos de uvas raras não atrapam turistas ou enólogos, são tesouro muito próprio que enebria quem ali escolhe. Em Liras de Sintra não se bebe defronte ao mar, este sim, oficina de sustento, mas jamais é negada uma copa a quem se conheça a dor ou o riso.
De costas para o mar e de frente para os telhados muito vermelhos, deixava-se Nuno da Costa Oliveira, o torpor do vinho formigando-lhe as pontas dos dedos, o olho vazado ainda mais vivo do que o outro. Já não pescava, mas os cheiros da maré baixa e do barro fresco, fusos como uma trama, o mantinham vivo. E ocupava-se em cuidar as ruas.
A meia visão perdida não foi fruto de lida mal feita no mar. Roubou-a um filho. Tomás. Fugido de Liras de Sintra após o agravo feito ao pai, não mais se soube dele. Uma notícia sequer, se vivo ou morto. E na função de Nuno Oliveira, o olhar as ruas era um imenso “perdôo-te” na espera do filho que já mais não vem.
Direto na têmpora: Captain Bacardi - Lee Ritenour
8 comentários:
muito bacana. chic o lance do olho vazado.
Valeu, Aroeira. Liras de Sintra tem sido uma grande inspiração.
Conheço Sintra. Aliás, fui mais de uma vez naquela cidade. Belíssima, próxima ao Cabo da Roca, local onde, dizem, Fernando Pessoa e um grupo empurraram um inimigo político lá do alto do penhasco (não sei se é verdade ou mentira).
Mas, Liras de Sintra, é o fruto de sua imaginação fértil e criativa. Todavia você consegue transmitir o clima da melancolia lusitana com uma precisão assustadora.
Parabéns. bela postagem.
Don Oliva
Obrigado, Oliva, acho que Liras de Sintra ainda vai render bastante aqui.
Ótima sacada na frase: "olhar as ruas era um imenso “perdôo-te” na espera do filho que já mais não vem".
um abraço,
clara lopez
E a vida gira assim, entre Nunos y Tomáses e que todos nós saibamos fazer a escolha certa
Obrigado, Clara, bom que gostou.
Mesmo que nem sempre percebamos que estamos escolhendo, ndms
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