Toda manhã o besouro cascudo passava voando em seu vôo esquisito e via a lagarta feia e peluda se arrastando para chegar até alguma folhinha que ela pudesse devorar inteira.
Ele, que os outros bichos viviam chamando de feio e desajeitado, olhava aquela coisinha verde e rastejante e pensava: "tadinha, se eles me tratam assim por ser tão feioso, imagina o que devem fazer com ela".
E aí, com pena da lagarta, o besouro começou a parar todos os dias para conversar com ela. Ele realmente tinha dó de todo aquele esforço que ela precisava fazer para andar um pouquinho e, como já tinha percebido que ela era um bichinho bem legal, começou a dar carona para a lagarta até as folhas mais verdinhas e gostosas no alto das árvores.
Ela ia grudada naquelas costas duras e ele ia se balançando todo. Aquela dupla de amigos realmente fazia uma dança muito esquisita no ar.
O tempo foi passando, o besouro e a lagarta ficaram cada vez mais próximos. O resto da bicharada, no entanto, ria e falava mal daquela parceria tão estranha entre duas criaturas tão feias e desajeitadas. Quando eles passavam, os insetos mais novos (e até mesmo alguns bem adultos), logo começavam a gritar:
"Lá vai a lagarta verdona
Com o besourão cascudo
Dupla mais esquisitona
Não existe nesse mundo"
Mas sempre que algum deles exagerava, o besourão se enfezava e ia defender a pobre lagartinha. Que aqui ninguém nos ouça, mas ele chegou mesmo a dar umas boas chifradas em um gafanhoto mais atrevido que tentou puxar os pelos da verdinha.
Algum tempo depois, o besouro percebeu que a lagarta andava calada, quietinha, meio afastada de tudo. Até que um dia ela começou a se enrolar num fio fininho, fininho e ficou toda cobertinha, fechadinha, parecendo um pãozinho francês.
O besouro ficou muito procupado. O que será que aquilo queria dizer? Será que sua amiguinha tinha morrido? Será que ela ia ficar lá dentro pra sempre?
Daquele dia em diante, ele não saiu mais do lado daquela trouxinha que um dia tinha sido sua amiga lagarta: afastava insetos curiosos, abria suas asas grossas para protegê-la do vento, limpava o lugar em volta e quando chovia muito, cobria-a com uma folha bem larga.
Uma certa manhã, logo que o sol nasceu, o besouro foi visitar o embrulhinho da sua amiga, mas viu que ele estava rasgado e sem nada lá dentro.
O besourão então chorou, chorou e chorou. Todo aquele cuidado com a amiga não tinha adiantado nada e ele nem teve a chance de se despedir dela.
Mas enquanto ele chorava, sentiu um ventinho gostoso nas suas duras costas cascudas. O que seria aquilo?
Ele então se virou lentamente e deu de cara com uma linda borboleta azul e dourada flutuando bem na sua frente. O besouro ficou maravilhado! Ele nunca tinha visto nada tão lindo em toda a sua vida.
De repente, a borboleta falou:
- Ei, meu amigo, não está me reconhecendo?
O besouro passou as patinhas nos olhos, tentou virar a cabeça, mas não conseguia saber quem era aquela criatura tão linda e nem entender como ela poderia conhecer justo ele, um besourão tão feio.
- Ora, besouro, você que cuidou tão bem de mim agora não sabe mesmo quem eu sou?
O besouro então olhou bem de perto e tomou um susto enorme. Aquele sorriso... aquele sorriso era da lagartinha!
Os dois então se abraçaram e riram e brincaram e ficaram muito felizes. A lagarta, aquela lagartinha feia, tinha virado uma borboleta maravilhosa! E a nova borboleta, feliz com o grande amigo que tinha, disse para todos os insetos que olhavam sem entender aquela dupla tão diferente.
- Meus amigos, então agora vocês todos olham para mim assim, tão admirados? Justo vocês que até outro dia riam e implicavam comigo e com meu amigo besouro? Pois saibam que se vocês me acham bonita hoje, se pensam que eu sou alguém importante, é tudo por causa dele que me defendeu durante todo esse tempo. E, para mim, nesse jardim inteiro, não tem bicho mais bonito e nem amigo mais leal do que o meu querido besouro.
E daquele dia em diante, onde ia a linda borboleta, ia também o besourão cascudo. Só que agora, não havia mais gritos, nem xingamentos e nem confusão. É que todos os insetos aprenderam, vendo aquela amizade tão bonita, que não importa se a gente é bonito ou feio, grande ou pequeno, colorido ou cinza.
O que importa de verdade é o bem que a gente faz pros outros e os amigos que a gente tem.
Direto na têmpora: Backass - Karen O
9 comentários:
Essa é a mais pura verdade Maurilo. Não podemos esquecer que Deus criou 2 pra um cuidar do outro. Precisamos fazer com que o HOJE do próximo seja sempre prazeroso, a vida reserva muito pra cada um de nós mas isso não interfere, "antes um bezouro bonzinho do que um pavão sozinnho"!
Vou Maurilo, também sei rimar! rsrsrs.
Adorei a historinha, delícia de ler!
Acho que vou contar pra meninada sábado que vem, Camila. Tomara que eles gostem também.
Vão gostar ...
Ficou lindo mesmo... Parabéns!
Obrigado, Fê. Te amo.
Maurilo, agora que tenho uma sobrinha de 11 meses estou tentando escrever historinhas para ela, mas, vejo que não é uma tarefa tão simples assim, pois tudo que crio parece ferir a inteligência dela ou parece piegas demais. Tomara eu consiga escrever com essa sutileza que você emprega em suas palavras. Parabéns pelo lindo conto. :)
Valeu, Sakana-san, tenho certeza de que você vai achar suas histórias também.
É o tipo da historinha que eu teria gostado de contar para meus filhos e netos. Além da beleza natural do conto, existe aí muitas mensagens para todo o tipo de gente. Meus parabéns e continuem contando essas histórias para nos, também
As suas historinhas eu conto até hoje pra Sophia, ndms. O exemplo que vem de casa a gente guarda pra sempre.
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